Palavras-Chave
tumor espinal - compressão da medula espinal - lombalgia
Keywords
espinal tumor - spinal cord compression - low back pain
Introdução
O câncer de mama é a principal causa de mortes relacionadas ao câncer em mulheres.[1] Metástase espinhal extramedular intradural é uma complicação rara de câncer sistêmico.
No seu conjunto, mestástases espinhais ocorrem no compartimento extradural em mais
de 90% dos casos. Estima-se que 5% dos casos de doença metastática envolvendo a coluna
vertebral ocorrem no espaço extramedular intradural.[2]
[3]
Poucos casos estão relatados.[4]
[5] Descrevemos o caso de uma paciente com diagnóstico anterior de câncer de mama, que
apresentou lombalgia e paraparesia como manifestação inicial da doença metastática
na medula espinhal.
Relato de Caso
Paciente do sexo feminino de 41 anos de idade apresentava lombalgia progressiva há
15 dias, que se iniciou com paraparesia crural. Foi admitida na sala de emergência.
Era capaz de andar apenas com a ajuda de um cuidador (McCormick – escala modificada
de grau IV).
Ao exame físico, a força muscular dos membros inferiores estava diminuída (grau IV),
havia hiperreflexia, sinal de Babinski bilateral, e nível T3 de hipoestesia tátil
e térmica. Controle do esfíncter anal e vesical estavam preservados; paciente não
apresentava qualquer massa palpável na coluna vertebral.
Anteriormente, com apenas 28 anos, foi diagnosticada com adenocarcinoma ductal de
mama. Passou por mastectomia radical esquerda com linfadenectomia, seguida por quimioterapia
sistêmica e radioterapia local. O painel de imuno-histoquímica do tumor foi negativo
para receptores de progesterona e estrogênio. Depois de 10 anos de acompanhamento,
apresentou metástase pulmonar lobar superior à esquerda na tomografia de tórax, sendo
realizada uma lobectomia do pulmão esquerdo, além de uma radioterapia local. Seu índice
na escala de Karnofsky (KPS) foi de 90 até o desenvolvimento da paraparesia.
A suspeita clínica da compressão da medula espinhal no nível de T3 foi apontada. A
radiografia de coluna torácica foi negativa para fratura óssea. A tomografia computadorizada
de tórax mostrou deformidade cifótica da coluna torácica e alteração do corpo vertebral
T8, sem lesões líticas, e nenhuma alteração no nível de T3. A ressonância magnética
revelou massa anterolateral direita, extramedular e intradural no interespaço T2-T3,
com compressão da medula espinhal, sem mais sinais de metástases ([Fig. 1]).
Fig. 1 Ressonância magnética com massa anterolateral direita, extramedular e intradural
no interespaço T2-T3.
Com base nesse achado o grupo decidiu pela realização da cirurgia, sendo feita laminectomia
T2-T3, abertura dural na linha média, com visualização ao microscópio de massa anterolateral
direita, acinzentada e amolecida. Utilizando técnicas cirúrgicas usuais, a lesão foi
completamente removida sem qualquer evento adverso. O diagnóstico de metástase foi
confirmado pela análise imuno-histoquímica. O tratamento foi completado com radioterapia
fracionada local (3 Gy em dez sessões), que foi iniciada 10 dias após a cirurgia.
Após 14 dias da cirurgia, a paciente já era capaz de andar (McCormick – escala modificada
de grau I). Após 3 meses de tratamento, não apresentava nenhum sinal de doença ativa.
Discussão
Metástase espinhal intradural e extramedular são eventos raros. Na maioria dos casos
em que estas metástases se desenvolveram, é notável o estágio avançado da doença primária.[4]
[6]
[7] O tipo histológico primário mais comun é o adenocarcinoma de mama, seguido por pulmão
e sítios de origem desconhecidos.
Em uma breve revisão sobre o assunto, Perrin et al[2] encontraram 9 de 10 casos envolvendo o cone medular e a cauda equina, embora autores
de uma revisão mais recente tenham identificado casos na junção cervicotorácica, sendo
disseminados pela via hematogênica, extensão direta do espaço epidural, disseminação
pelos vasos linfáticos perineurais e líquor.[2]
[3]
[8]
[9] No entanto, alguns autores[2]
[9] acreditam que o principal mecanismo de disseminação seja pelo líquor, baseados no
fato de que 80% destas metástases espinhais serem sincrônicas com metástases cerebrais,[2]
[4] o que não foi observado em nosso caso.
Os pacientes sintomáticos geralmente apresentam uma síndrome clínica característica,[10] com lombalgia e/ou cervicalgia em aproximadamente 80% dos casos, seguidas por diminuição
de força nos membros, perdas sensoriais e disfunção esfincteriana. Os pacientes que
apresentam história compatível com compressão medular devem ser investigados, sendo
a ressonância magnética o exame mais sensível para investigação de doenças intradurais.
No exame de ressonância magnética, metástases aparecem isointensas nas sequências
ponderadas em T1, hiperintensas nas sequências ponderadas em T2 e com realce após
administração de contraste.[6] Meningiomas e schwannomas espinhais devem ser considerados como diagnóstico diferencial.
O tratamento de metástases intradurais extramedulares ainda é um desafio. As opções
de tratamento podem incluir ressecção cirúrgica, radioterapia, quimioterapia sistêmica,
ou terapia hormonal, dependendo do tipo celular. Todos estes tratamentos são geralmente
limitados e, por conseguinte, têm sido utilizados empiricamente, analisando caso a
caso. Entre as opções terapêuticas disponíveis, a radioterapia fracionada tem sido
o tratamento mais eficaz quando os pacientes não estão neurologicamente comprometidos.[11]
[12] Os resultados da excisão cirúrgica no passado não eram favoráveis, e os autores
recomendavam uma abordagem conservadora.[2] Radiocirurgia estereotáxica é uma alternativa de tratamento. Utilizando uma dose
média de 13,8 Gy, verificou-se que 80% dos pacientes melhoraram seus sintomas neurológicos,
sendo que o tempo médio de sobrevida dos pacientes foi de 8 meses.[13] Alguns autores[4] relatam alta morbidade em pacientes que foram submetidos a ressecção cirúrgica.
Por outro lado, outra série de autores mostra recuperação pós-operatória e alívio
da dor, de 67 e 44%, respectivamente, apresentando melhoria significativa do grau
de McCormick, independente da extensão da ressecção cirúrgica.[14] No nosso caso, optamos pela ressecção cirúrgica devido à boa performace clínica
e oncológica anterior, ao achado de carcinomatose leptomeníngea focal e à piora neurológica
aguda. A recuperação motora apresentada por esta paciente mostra-nos que a abordagem
cirúrgica pode trazer benefícios. Além do tratamento cirúrgico, a radioterapia fracionada
com dose total média de 30 Gy é um tratamento eficaz, evitando recorrência local,
e dobra a expectativa de vida de 2 para 4 meses. Além disso, uma cirurgia adicional
pode melhorar o tempo de sobrevida para 8 meses.[12]
Conclusão
Metástase espinhal extramedular intradural aparece em estágios avançados do câncer.
O objetivo do tratamento cirúrgico deve ser estritamente paliativo com a intenção
de reduzir a dor e os déficits neurológicos. A radiocirurgia estereotáxica e a radioterapia
local podem ser opções de tratamento alternativo ou utilizadas em conjunto com o tratamento
cirúrgico. No entanto, é fundamental a necessidade de mais estudos prospectivos cegos
e randomizados para definir qual é a melhor abordagem para esta doença.