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DOI: 10.1055/s-0040-1712493
Lesões condrais maiores tratadas com uso de membrana de colágeno – condrogênese autóloga induzida por matriz – apresentam maior aumento nos escores clínicos
Article in several languages: português | EnglishResumo
Objetivo Avaliar clínica e radiologicamente os resultados do tratamento das lesões condrais com a membrana de colágeno – condrogênese autóloga induzida por matriz.
Métodos Trata-se de uma série de casos observacional, na qual foram analisados 15 pacientes submetidos a condrogênese autóloga induzida por matriz. A avaliação clínica foi feita comparando os escores de Lysholm e International Knee Document Commitee (IKDC, na sigla em inglês) no pré- e pós-operatório de 12 meses, e avaliação radiológica através do escore de Magnetic Resonance Observation of Cartilage Repair Tissue (MOCART, na sigla em inglês) no mesmo período de pós-operatório.
Resultados A média de idade dos pacientes foi 39,2 anos, e a média do tamanho das lesões condrais foi de 1,55cm2. Houve uma melhora significativa nos escores clínicos, com média de aumento de 24,6 pontos no Lysholm e de 24,3 no IKDC, após 12 meses. Na avaliação radiológica, o MOCART teve média de 65 pontos. Observou-se que quanto maior o tamanho da lesão, maior foi a melhora nos escores.
Conclusão Avaliando escores clínicos subjetivos, o tratamento das lesões condrais com a membrana de colágeno mostrou bons resultados, assim como a avaliação de MOCART, com maior benefício em lesões maiores.
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Introdução
A função biomecânica da matriz de proteoglicanos e fibras colágenas da cartilagem é absorver cargas compressivas e tensionais que atuam sobre a articulação.[1] Lesões da cartilagem são observadas em até 11% das artroscopias, sendo metade dessas > 2 cm2.[2] A maioria tem relação com trauma ou osteocondrite dissecante.
A capacidade de cura da cartilagem é limitada[3] [4] podendo levar a osteoartrose.[5] Um dos grandes desafios para o cirurgião ortopédico continua a ser o tratamento das lesões condrais.[6] Devido ao baixo potencial de cura, e ao grau de desconforto que essas lesões causam, a intervenção cirúrgica tem sido amplamente usada na tentativa de preencher os defeitos cartilaginosos.[7] [8] As células mesenquimais são a fonte para regeneração.[9]
Pridie,[10] em 1959, foi o primeiro a realizar estímulo ao reparo utilizando sangue oriundo da medula óssea. Steadman et al.,[11] em 2001, introduziram a técnica das microfraturas. A microfratura é a técnica para recrutar as células mesenquimais, pois o coágulo promove um meio favorável para o tecido de reparo cartilaginoso.[12] O tecido cicatricial “fibrocartilagem-like”[13] previne a osteoartrose e melhora os sintomas dos pacientes.[14]
Como o coágulo formado não possui boa resistência mecânica, foi proposto o uso da membrana de colágeno.[15] [16] [17] A condrogênese autóloga induzida por matriz (AMIC, na sigla em inglês) é uma técnica que combina as microfraturas com a membrana de colágeno.[18] Enquanto as microperfurações estão indicadas para defeitos < 2 cm2, a AMIC é indicada para defeitos maiores.[19]
O objetivo do presente estudo é avaliar clinica e radiologicamente os resultados do tratamento das lesões condrais do joelho com uso da membrana de colágeno – AMIC.
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Metodologia
O presente estudo é uma série de casos observacional de pacientes com lesões condrais do joelho, operados entre 2015 e 2018 com utilização de membrana de colágeno pela técnica AMIC e aprovado pelo comitê de ética da instituição.
Todos os pacientes participantes do presente estudo foram esclarecidos sobre a técnica cirúrgica indicada e outras opções de tratamento, suas vantagens e desvantagens, e concordaram com a realização do procedimento escolhido.
As indicações foram pacientes entre 15 e 55 anos de idade, com lesões condrais de 0,5 a 5,0 centímetros de diâmetro, na patela, tróclea ou côndilos femorais, graus III ou IV de ICRS (Internacional cartilage repair society), ativos e sintomáticos. Não foram incluídos pacientes com história de cirurgia prévia para cartilagem, mau-alinhamento do membro inferior acometido ou instabilidade ligamentar não corrigidos previamente ou concomitantemente ao procedimento. Os critérios de exclusão foram pacientes que abandonaram o acompanhamento ambulatorial ou não concordaram em participar.
Um total de 15 pacientes foram incluídos no estudo, 12 homens e 3 mulheres, todos operados pelo mesmo cirurgião.
Avaliação pré-operatória
Os pacientes que apresentaram suspeita de lesão condral no joelho, de acordo com anamnese e exame físico, realizaram exames de imagem complementares para conclusão diagnóstica, com radiografias e ressonância magnética (RM), podendo caracterizar e medir a lesão condral e identificar lesões ligamentares ou mau alinhamento dos membros inferiores. Dessa forma, foram identificados os pacientes que preenchiam os critérios para inclusão no estudo.
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Técnica cirúrgica
Primeiramente, era realizada artroscopia do joelho acometido, para localizar a lesão condral, e avaliar os ligamentos e meniscos. Então, posteriormente, uma artrotomia parapatelar longitudinal era realizada de acordo com a região articular a ser operada. Quando houve algum outro procedimento cirúrgico concomitante, como reconstrução do ligamento cruzado anterior ou osteotomia valgizante da tíbia, a condroplastia foi realizada sempre por último.
Após desbridamento do defeito condral, retirada de tecido cartilaginoso degenerado e inviável, era realizada a curetagem do leito da lesão retirando toda camada calcificada e preservando o osso subcondral ([Figura 1]).
Utilizando um template metálico, era definido com precisão o tamanho e formato da lesão, a membrana de colágeno tipo I/III de origem porcina (Chondrogide; Geistlich Pharma AG, Wolhusen, Suíça) que iria cobrir o defeito era recortada. Em seguida, eram realizadas microperfurações no osso subcondral, à mão livre com 2 a 4mm de distância entre eles. A membrana era então colocada sobre o defeito e fixada provisoriamente com duas agulhas. A fixação definitiva da membrana era feita com fio absorvível monocryl 5.0 e complementada com cola de fibrina nas bordas da lesão.
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Reabilitação
Apesar dos diferentes procedimentos cirúrgicos associados ao uso da membrana de colágeno, o protocolo de reabilitação se iniciou com 3 semanas de imobilização com brace articular e sem descarga de peso no membro operado.
Com o objetivo de reduzir o quadro inflamatório, até a 5a semana era iniciado o aumento da amplitude de movimento e ativação do músculo quadríceps. Após isso, até a 8ª semana, o paciente foi incentivado a deambular sem uso de órtese, progressivamente, até normalizar a marcha. Entre 6 e 8 meses, o paciente era liberado para praticar esportes de contato.
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Coleta de dados
Dados demográficos como idade, sexo, lateralidade, tamanho e localização da lesão condral, e procedimentos associados foram coletados do banco de dados. A avaliação clínica pré-operatória foi feita com os escores de Lysholm[20] e International Knee Document Commitee (IKDC),[21] e a pós-operatória com um ano de seguimento, através do Lysholm, IKDC, e o escore radiológico de Magnetic Resonance Observation of Cartilage Repair Tissue (MOCART).[22] Este escore é um sistema de pontuação que busca avaliar o tecido de reparo em sua extensão, intensidade do sinal, preenchimento do defeito, integração com a cartilagem adjacente, entre outros.
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Análise estatística
Inicialmente, todas as variáveis foram analisadas descritivamente. Para as variáveis quantitativas, esta análise foi feita através da observação dos valores mínimos e máximos, e do cálculo de médias, desvios padrão (DPs) e quartis. Para as variáveis qualitativas, calcularam-se frequências absolutas e relativas. Para a comparação de médias de dois momentos de avaliação, foi utilizado o teste t de Student pareado.[23] Para o estudo das correlações entre os deltas dos escores e variáveis avaliadas no estudo, foi utilizado o coeficiente de correlação de Pearson. O software utilizado para os cálculos foi o SPSS Statistics for Windows, Version 17.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA). O nível de significância utilizado para os testes foi de 5%.
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Resultados
Foram avaliados 15 pacientes com idade entre 15 e 54 anos (média de 39,2 anos), sendo 3 mulheres e 12 homens. As lesões acometeram a tróclea femoral em seis casos, a patela em cinco casos e os côndilos femorais em quatro casos. Na [Tabela 1], apresenta-se a distribuição de frequências do local da lesão.
Local da lesão |
n |
% |
---|---|---|
CFM + CFL |
1 |
6,7 |
CFM D |
3 |
20,0 |
Patela D |
3 |
20,0 |
Patela E |
2 |
13,3 |
Tróclea D |
4 |
26,7 |
Tróclea E |
2 |
13,3 |
Total |
15 |
100,0 |
O tamanho das lesões variou de 0,6 cm2 até 2,34 cm2, medidos através das RMs pré-operatórias, e o índice de massa corporal (IMC) variou de 21,6 kg/m2 até 32,5 kg/m2, conforme mostra a [Tabela 2] com os valores descritivos dessas variáveis.
Variável |
n |
Média |
dp |
Mínimo |
Máximo |
---|---|---|---|---|---|
Tamanho |
15 |
1,55 |
0,58 |
0,60 |
2,34 |
IMC |
15 |
27,6 |
2,6 |
21,6 |
32,5 |
Os escores Lysholm e IKDC foram avaliados nos momentos pré- e pós-cirurgia, com 12 meses. Houve aumento significativo nas médias do escore de Lysholm (55,9 versus 80.5) e do escore IKDC (51,6 versus 75,9) do pré- para o pós-operátorio (p < 0.001) ([Figuras 2] e [3]).
Os escores Tegner e Mocart foram avaliados em um único momento e estão descritos na [Tabela 3]. Através dos resultados obtidos com as RMs após 1 ano, foi mostrado que todos os pacientes mantiveram o preenchimento da lesão condral com tecido de reparo, com boa integração das bordas. A média do escore de MOCART foi de 65 pontos, variando de 50 a 75.
Variável |
n |
Média |
dp |
Mínimo |
Máximo |
---|---|---|---|---|---|
Tegner |
15 |
3,9 |
1,1 |
2,0 |
6,0 |
Mocart |
15 |
65,0 |
7,8 |
50,0 |
75,0 |
Para o estudo de possíveis correlações entre variáveis e a variação pré e pós-operatória dos escores, foi calculado o delta de variação dos escores apresentados na [Tabela 4].
Variável |
n |
Média |
dp |
Mínimo |
Máximo |
---|---|---|---|---|---|
Lysholm |
15 |
24,6 |
9,0 |
11,0 |
41,0 |
IKDC |
15 |
24,3 |
7,1 |
12,6 |
33,4 |
Na [Tabela 5] apresentam-se os coeficientes de correlação entre a idade, tamanho da lesão e IMC e os deltas de variação dos escores Lysholm e IKDC. Há correlação positiva e significativa entre o tamanho da lesão e o delta de variação do escore IKDC. Portanto, quanto maior o valor do tamanho da lesão, maior o delta de variação do escore IKDC ([Figura 4]). Não foi encontrada relação entre a melhora observada e a idade e IMC.
Delta Lysholm |
Delta IKDC |
||
---|---|---|---|
Idade |
r |
0,266 |
- 0,188 |
valor-p |
0,338 |
0,502 |
|
n |
15 |
15 |
|
Tamanho |
r |
- 0,143 |
0,593 |
valor-p |
0,610 |
0,020 |
|
n |
15 |
15 |
|
IMC |
r |
0,450 |
- 0,017 |
valor-p |
0,092 |
0,953 |
|
n |
15 |
15 |
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Discussão
O achado mais importante do presente estudo foi que pacientes com lesões condrais de maior tamanho tiveram um maior aumento nos escores clínicos, portanto um maior benefício com o tratamento. Esses resultados mostram concordância com o estudo anterior publicado pelo grupo.[24] Não houve impacto significante da idade e IMC nos resultados encontrados neste estudo.
A técnica AMIC vem sendo utilizada por diversos cirurgiões, sendo estabelecida como uma opção no tratamento dos defeitos cartilaginosos. Já foi mostrada em estudos anteriores a capacidade das microfraturas no osso subcondral em levar células mesenquimais da medula óssea para a região da cartilagem, promovendo o aporte de fatores de crescimento e citocinas. Testes in vitro já demonstraram que a membrana de colágeno pode reter as células mesenquimais, podendo melhorar a capacidade regenerativa da técnica de microfraturas.[15]
Um estudo de 2008 comparou os resultados do tratamento das lesões condrais com microfraturas, utilizando ou não a membrana de colágeno em lesões acetabulares. Foi mostrado que a uma melhora mais sustentada dos escores clínicos foi alcançada com a utilização da membrana.[25]
Comparado com outros procedimentos cirúrgicos para tratamento dos defeitos cartilaginosos, a combinação das microfraturas com a membrana de colágeno é uma boa opção, com apenas um tempo cirúrgico, de baixo custo, sem morbidade de área doadora sadia ou necessidade de proliferação celular in vitro, como no transplante osteocondral autólogo e o transplante autólogo de condrócitos, respectivamente. A mesma técnica do presente estudo, realizada artroscopicamente, já foi descrita por Piontek et al., apresentando resultados promissores.[26] Schagemann et al.,[27] em 2018, compararam a técnica artroscópica do AMIC com a técnica mini open, semelhante à do presente trabalho, concluindo não haver diferença nos resultados a médio prazo, com 2 anos de seguimento.
Dhollander et al.[28] já reportaram melhoras satisfatórias após 2 anos de pós-operatório, porém uma tendência à deterioração do tecido de reparo, analisado pela RM. Nesta série de casos, as melhoras foram boas ou excelentes. Através dos exames de imagem, não foram observados afilamento ou hipercrescimento dos tecidos de reparo. Outros estudos já demonstraram não haver melhora clínica no mesmo ritmo da evolução do tecido de reparo observado pelas RMs.[22] Acreditamos que a avaliação radiológica possa ser um indicativo de falha do tratamento, porém não um indicativo de sucesso.
Existem limitações que devem ser consideradas ao avaliar o presente trabalho. O pequeno número de pacientes reflete uma realidade para os cirurgiões do país, pelo acesso ao material necessário ao procedimento. Devido a isso, as lesões são descritas em partes diferentes da articulação, com variados procedimentos concomitantes, tornando a amostra mais heterogênea.
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Conclusão
Avaliando escores clínicos subjetivos, o tratamento das lesões condrais com a membrana de colágeno mostrou bons resultados, assim como a avaliação de MOCART, e que existe maior benefício em lesões maiores.
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Conflito de Interesses
Os autores declaram não haver conflito de interesses.
∗ Trabalho desenvolvido no Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil.
Suporte Financeiro
Não houve suporte financeiro de fontes públicas, comerciais, ou sem fins lucrativos.
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Referências
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Endereço para correspondência
Publication History
Received: 11 December 2019
Accepted: 02 March 2020
Article published online:
25 September 2020
© 2020. Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. This is an open access article published by Thieme under the terms of the Creative Commons Attribution-NonDerivative-NonCommercial License, permitting copying and reproduction so long as the original work is given appropriate credit. Contents may not be used for commecial purposes, or adapted, remixed, transformed or built upon. (https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/)
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