CC BY-NC-ND 4.0 · Rev Bras Ortop (Sao Paulo) 2023; 58(03): 507-513
DOI: 10.1055/s-0042-1756326
Artigo Original
Quadril

Fratura da cabeça femoral de tipo II de Pipkin: Avaliação biomecânica pelo método de elementos finitos[*]

Article in several languages: português | English
1   Hospital Regional do Gama, Brasília, Distrito Federal, Brasil
2   Departamento de Ortopedia, Instituto de Pesquisa e Ensino, Hospital Ortopédico e Medicina Especializada (IPE-HOME), Brasília, Distrito Federal, Brasil
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1   Hospital Regional do Gama, Brasília, Distrito Federal, Brasil
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2   Departamento de Ortopedia, Instituto de Pesquisa e Ensino, Hospital Ortopédico e Medicina Especializada (IPE-HOME), Brasília, Distrito Federal, Brasil
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3   Departamento de Ortopedia e Anestesiologia, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (FMRP-USP), Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil
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4   Departamento do Aparelho Locomotor, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil
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5   Serviço de Ortopedia e Traumatologia Nova Monteiro, Hospital Municipal Miguel Couto, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil
› Author Affiliations
 

Resumo

Objetivo Avaliar a capacidade biomecânica de duas formas de fixação de fraturas tipo II de Pipkin descrevendo o desvio da fratura no sentido vertical, as tensões máxima e mínima principais, e a tensão equivalente de Von Mises nas sínteses utilizadas.

Materiais e Métodos Dois fixadores internos foram desenvolvidos para tratar a fratura tipo II de Pipkin por meio de elementos finitos: parafuso cortical de 3,5 mm e parafuso de Herbert. Sob as mesmas condições, foram avaliados o desvio da fratura no sentido vertical, as tensões máxima e mínima principais, e a tensão equivalente de Von Mises nas sínteses utilizadas.

Resultados Os deslocamentos verticais avaliados foram de 1,5 mm e 0,5 mm. Os valores de tensão máxima obtidos na região superior do colo femoral foram de 9,7 KPa e 1,3 KPa, e os valores de tensão mínima obtidos na região inferior do colo femoral foram de -8,7KPa e -9,3 KPa. Por fim, os valores de pico da tensão equivalente de Von Mises foram de 7,2 GPa e 2,0 GPa para os modelos de fixação com o uso do parafuso cortical de 3,5 mm e do parafuso de Herbert, respectivamente.

Conclusão O sistema de fixação com parafuso de Herbert gerou os melhores resultados em termos de redução do deslocamento vertical, distribuição da tensão máxima e do pico da tensão equivalente de Von Mises, o que demonstra sua superioridade mecânica comparada à do parafuso cortical de 3,5 mm no tratamento da fratura tipo II de Pipkin.


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Introdução

As fraturas da cabeça femoral, descritas em 1869,[1] apesar da rara incidência (de 8% a 26%) em comparação com outras lesões proximais ou articulares do quadril, apresentam grande importância clínica e científica pela complexidade cirúrgica e predisposição ao desenvolvimento de disfunções graves.[2] De etiologia ligada a acidentes automobilísticos com impactos de alta energia, costumam ser acompanhadas por deslocamentos posteriores do quadril (de 5% a 15%).[3] [4] A abordagem conservadora de tratamento não apresenta bons resultados, sendo assim a redução aberta com fixação interna a recomendação principal.[3] [5] O planejamento cirúrgico depende da severidade da lesão, e inicialmente se orienta pela classificação de Pipkin (de tipos I a IV)[1] [2] [3] [4] [5] [6] ([Fig. 1]).[7]

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Fig. 1 Classificação de Pipkin. (A) Tipo I: fratura da cabeça femoral inferior à fóvea central. (B) Tipo II: fratura estendida superiormente à fóvea central. (C) Tipo III: qualquer fratura da cabeça do fêmur com fratura do colo do fêmur associada. (D) Tipo IV: qualquer fratura da cabeça femoral com fratura acetabular associada.[7]

As lesões do tipo II apresentam grande controvérsia em relação aos modelos de abordagem e fixação, com escassa investigação científica.[2] [3] [8] [9] [10] [11] Estudos anteriores (relatos de caso e análises retrospectivas) evidenciam resultados favoráveis com a utilização de parafusos corticais de minifragmento (de 2.0 mm a 2.4 mm)[9] e parafusos de Herbert.[8] [10] Por outro lado, apesar da sua diferenciada capacidade de compressão comparada a outras sínteses e sua ampla utilização clínica, os parafusos canulados de 3 mm vêm sendo associados a uma maior predisposição de desenvolver osteoartrite.[12]

A base científica para o planejamento e o planejamento cirúrgico da fratura tipo II de Pipkin é composta por relatos de caso e estudos longitudinais. A falta de ensaios mecânicos pautados em metodologias validadas dificulta a realização de uma sólida medicina baseada em evidências, fato tangível pela sua baixa frequência. Pelo que sabemos, a investigação biomecânica do tratamento de fraturas tipo II de Pipkin por meio do método de elementos finitos (MEF) até o momento foi negligenciada. A possibilidade de execução de estudos biomecânicos complexos, que permitem a visualização do desempenho mecânico das sínteses e da fratura em análise, demonstra o potencial e explica a utilização do MEF.[13] [14]

Dessa forma, objetivamos avaliar a capacidade biomecânica de duas formas de fixação de fraturas tipo II Pipkin (parafuso cortical de 3,5 mm e parafuso de Herbert), descrevendo o desvio da fratura no sentido vertical, as tensões máxima e mínima principais, e a tensão equivalente de Von Mises nas sínteses utilizadas. Este é o primeiro relatório biomecânico por meio do MEF voltado à comparação de dois tratamentos para fraturas tipo II de Pipkin.


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Materiais e Métodos

Características Dimensionais e Técnica de Inserção dos Parafusos

O parafuso de Herbert foi formatado apresentando como maior diâmetro de suas roscas, 4,3 mm e 5,3 mm, distal e proximal, respectivamente, e em seu corpo (área sem rosca) 3,3 mm de diâmetro. Já o parafuso cortical de 3,5mm, respeitou criteriosamente as semelhanças dimensionais por cada parte estrutural, disponível pela marca Depuy-Synthes (Raynham, MA, Estados Unidos) ([Figs. 2C] e [D]).

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Fig. 2 Condições e contornos dos ensaios. (A) Vista frontal. (B) Vista lateral de modelo com representação de fratura da cabeça femoral tipo II de Pipkin e posicionamento durante o ensaio. Área verde na base do fêmur: ponto de fixação. Área rosa na cabeça femoral: local de carregamento. (C) Parafuso cortical de 3,5 mm. (D) Parafuso de Herbert.

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Análise pelo Método de Elementos Finitos

Para as análises, foram utilizadas imagens tomográficas de um fêmur sintético (Sawbones, Vashon Island, WA, Estados Unidos, modelo 3403-103, de quarta geração, e de 10 libras por pé cúbico) de tamanho médio do lado esquerdo.

No estudo pelo MEF, os materiais utilizados são divididos, de acordo com suas características, em dúcteis e não dúcteis. Os materiais metálicos, por exemplo, as sínteses, pertencem ao grupo dos dúcteis, e têm a tensão medida pelo ensaio de tensão equivalente de Von Mises. Entretanto, a tensão equivalente de Von Mises não é aplicada para a análise de ossos, visto que esses pertencem ao grupo dos materiais não dúcteis, sendo adequada a utilização de tensões máximas e mínimas principais para sua avaliação.

Em seguida, descrevemos em detalhes as variáveis de análise da tensão equivalente de Von Mises e das tensões máximas e mínimas principais.

Tensão equivalente de Von Mises: os materiais de características metálicas têm sua tensão medida pelo ensaio de tensão equivalente de Von Mises, que consiste de uma magnitude proporcional à energia de distorção usada em ensaios de falha de materiais dúcteis em que é prevista a falha do material, independentemente do estado de tensão/deformação, o que significa que as tensões de tração e de compressão são consideradas iguais.

Tensão máxima principal: para a sua análise, tem-se a força de tração composta por carga que corresponde a tracionar o sólido, sendo que este tipo de força apresenta valores positivos, sendo assim a força de tração composta por uma carga que pretende esticar ou estender o sólido.

Tensão mínima principal: para a sua análise, tem-se a força de compressão composta por carga que corresponde a comprimir o sólido, sendo que este tipo de força é representada por valores negativos, de forma conceitual, apenas para informar o sentido contrário de sua aplicação em relação a máxima principal.


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Confecção do Biocad

Os modelos virtuais tridimensionais (3D) de cada sistema (osso, síntese) foram feitos por meio do programa Rhinoceros (Robert McNeel & Associates, Seattle, WA, Estados Unidos), versão 6, e a análise pelo MEF foi realizada no programa Altair SimLab (HyperWorks, Troy, MI, Estados Unidos) utilizando o solver Altair Optistruct.

A partir dos modelos dos ossos sintéticos, foram obtidas imagens tomográficas do osso, que foram arquivadas de acordo com o protocolo de comunicação de imagens digitais em medicina (Digital Imaging and Communications in Medicine, DICOM, em inglês). Utilizou-se o tomógrafo de 16 canais Emotion (Siemens Healthineers, Erlangen, Alemanha) com resolução de 512 × 512 e distância entre cortes de 1,0 mm. O arquivo DICOM foi importado para o programa InVesalius(Software livre do Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer, Campinas, SP, Brasil) para a reconstrução 3D da estrutura anatômica. Com base em um conjunto de imagens bidimensionais obtidas por meio de equipamentos da tomografia computadorizada, o programa permite que sejam gerados modelos virtuais 3D das regiões de interesse ([Fig. 2]). Após a reconstrução 3D das imagens DICOM, o programa permite a geração de arquivos 3D no formato chamado stereo lithography ou standard triangle language (STL).


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Conversão dos Arquivos

No InVesalius, foram importadas todas as fatias para a obtenção do arquivo STL com as imagens que seriam usadas no processo de obtenção do sólido 3D, com isso tem a opção da geração multiplanar que mostra a visão de imagens sagitais, coronais, axiais e o volume. A partir do volume, é realizada a criação da superfície 3D, na qual se podem selecionar as regiões de interesse por meio de máscaras e ou filtros, que fazem com que o arquivo seja ocultado ou retratado de acordo com o algoritmo em questão, gerando, assim, a superfície 3D.


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Simulação

O MEF foi utilizado para as simulações da estabilidade das diferentes montagens. Primeiro, os arquivos foram importados para o Altair Simlab, com identificação de cada parte dos modelos digitais.


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Propriedades dos Materiais

Para realizar as simulações, é necessário conhecer e definir as propriedades dos materiais de cada uma das partes dos modelos digitais, sendo eles: osso cortical, osso trabecular e liga de aço. As propriedades dos materiais utilizados para as simulações são: módulo de elasticidade e coeficiente de Poisson ([Tabela 1]).

Tabela 1

Material

Propriedades

Módulo de elasticidade (MPa)

Coeficiente de Poisson (v)

Osso cortical

17

0,26

Osso trabecular

1,7

0,26

Sínteses (aço)

193

0,33


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Condições de Contorno

Para definir as condições de contorno, foi aplicado um carregamento de 6.000 N na região superior da cabeça femoral na direção do eixo Z. Não foram aplicados carregamentos nos eixos X e Y. O carregamento foi realizado com o posicionamento de 20° de inclinação posterior e 0° no eixo axial, mantendo-se os 10° fisiológicos de anteversão do colo femoral. Posteriormente, foram delimitadas as regiões de restrição de movimentos (fixados), marcados em todas as direções dos eixos X, Y, e Z, de deslocamento e rotação. Estas restrições são para garantir que o sistema tenha um perfeito alinhamento, sem deslocamento e/ou rotação ([Figs. 2A] e [B]).

Posteriormente ao controle de malhas de cada parte, deve-se sempre tomar o cuidado de manter o tamanho do elemento, para não haver problemas de contato entre as diferentes partes (fêmur e sínteses) nas simulações. O elemento adotado para formação das malhas foi o tetraédrico. A quantidade de nós também foi definida.


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Critérios de Análise

O deslocamento dos modelos e o deslocamento específico de cada fragmento foram analisados pelo MEF. Para a análise das tensões nos materiais não dúcteis (osso e fratura), utilizamos as variáveis tensão máxima principal (tração) e tensão mínima principal (compressão). Para os materiais dúcteis (metálicos), analisou-se a tensão equivalente de Von Mises.

As variáveis tensões máxima e mínima principais e tensão equivalente de Von Mises são princípios da matéria apresentados em forma de tensão. A unidade de medida da tensão é o Pascal (Pa), e as forças de tensão são medidas nas unidades Mmegapascal (MPA) e gigapascal (GPa).

Os resultados foram expressos em valores absolutos e percentis por meio da equação: valor maior ×X = valor menor × 100 (regra de 3 simples), sendo o valor percentil final igual a 100–X.


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Resultados

Descrição do Deslocamento Vertical da Fratura com os Diferentes Modelos de Fixação

Os deslocamentos verticais avaliados foram de 1,5 mm e 0,5 mm para os modelos de fixação com o uso do parafuso cortical de 3,5mm e do parafuso de Herbert, respectivamente ([Fig. 3]).

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Fig. 3 Descrição do deslocamento vertical da fratura com os diferentes modelos de fixação. (A) Parafuso cortical de 3,5 mm (deslocamento: 1,5 mm). (B) Parafuso de Herbert (deslocamento: 0,5 mm).

Observou-se que o parafuso de Herbert reduziu o deslocamento vertical em cerca de 66,6% comparado com o parafuso cortical de 3,5 mm nas fraturas da cabeça do fêmur tipo II de Pipkin.


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Distribuição das Tensões Máxima (Tração) e Mínima (Compressão) Principais nas Fraturas com os Diferentes Modelos de Fixação

Os valores da tensão máxima principal obtidos na região superior do colo femoral adjacentes à fratura foram de 9,7 KPa e de 1,3 KPa para os modelos de fixação com o uso do parafuso cortical de 3,5mm e pdo arafuso de Herbert, respectivamente ([Figs. 4A] e [B]), o que representa uma redução de 87% da tensão local e uma melhor distribuição com o parafuso de Herbert.

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Fig. 4 Distribuição da tensão máxima principal nas fraturas com os diferentes modelos de fixação. (A) Parafuso cortical de 3,5 mm: 9,7 KPa. (B) Parafuso de Herbert: 1,3 KPa. Distribuição da tensão mínima principal nas fraturas com os diferentes modelos de fixação. (C) Parafuso cortical de 3,5 mm: -8,7 KPa. (D) Parafuso de Herbert: -9,3 KPa.

Os valores da tensão mínima principal obtidos na região inferior do colo femoral adjacente à fratura foram de -8,7 KPa e de -9,3KPa para os modelos de fixação com o uso do parafuso cortical de 3,5mm e do parafuso de Herbert, respectivamente ([Figs. 4C] e [D]), o que representa um incremento de 6,4% da tensão local com distribuição equiparável com o parafuso de Herbert.


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Distribuição do Pico de Tensão Equivalente de Von Mises nos Diferentes Modelos de Fixação

Os valores do pico de tensão equivalente de Von Mises foram de 7,2GPa e de 2,0 GPa para os modelos de fixação com o uso do parafuso cortical de 3,5 mm e do parafuso de Herbert, respectivamente. A redução observada com o parafuso de Herbert foi de aproximadamente 72,2%. Além disso, os modelos de síntese apresentaram sua maior área de tensão na linha da fratura, local que representa uma maior preocupação na fratura da síntese ([Fig. 5]).

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Fig. 5 Distribuição do pico de tensão equivalente de Von Mises nos diferentes modelos de fixação. (A) Parafuso cortical de 3,5 mm: 7,2 GPa. (B) Parafuso de Herbert: 2,0 GPa.

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Discussão

Historicamente, as fraturas da cabeça do fêmur são associadas a resultados controversos e dependentes da síntese utilizada. A fixação interna precisa garantir estabilidade, preferencialmente com compressão entre o fragmento da fratura e o restante da cabeça do fêmur.[3] Por se tratar de uma fratura rara, ensaios mecânicos experimentais ou computacionais são extremamente importantes, pois viabilizam dados que auxiliam nos desfechos dos pacientes. O MEF é comprovadamente uma metodologia eficiente para pesquisas biomecânicas na área de fraturas ósseas.[14] [15]

Assim, por meio do MEF, avaliamos o desvio da fratura no sentido vertical, as tensões máxima e mínima principais, e a tensão equivalente de Von Mises de 2 sínteses amplamente utilizadas (parafuso cortical de 3,5 mm e parafuso de Herbert) no tratamento da fratura tipo II de Pipkin. Pelo que sabemos, este é o primeiro modelo de MEF em fratura tipo II de Pipkin, e o primeiro estudo de comparação de tratamentos usando métodos biomecânicos. Nossos resultados evidenciam a superioridade do parafuso de Herbert, que provoca diminuição do deslocamento vertical, e distribuição da tensão máxima principal e do pico da tensão equivalente de Von Mises.

A busca por sínteses que promovam fixação interna adequada, possibilitem a mobilização precoce, e, assim, contribuam para bons resultados clínicos foi tema de pesquisas clínicas anteriores, que apontam na mesma direção dos resultados biomecânicos do presente estudo os efeitos positivos do parafuso de Herbet nas fraturas tipo II de Pipkin. Em 1988, Murray et al.[10] realizaram uma redução aberta e fixação interna com parafuso de Herbert em uma fratura osteocondral da cabeça femoral. Após doze meses, os resultados demonstraram excelente função do quadril e nenhuma evidência radiográfica de necrose avascular. Mais recentemente, Zaizi et al.[8] relataram bons resultados no tratamento da fratura tipo II de Pipkin II por meio de redução anatômica e fixação interna com dois parafusos de Herbert após dois anos de acompanhamento. Wang et al.,[11] em uma análise prospectiva de três pacientes tratados com parafusos de Herbert, relataram resultados de função do quadril satisfatória, avaliada pela escala modificada de Merle d'Aubigné.

Apesar das inúmeras dificuldades clínicas do tratamento de fraturas em articulações de suporte de peso, a possibilidade de compressão inerente à característica das diferenças das roscas (distal e proximal) do parafuso de Herbert, e que para isso tenha que ter um maior diâmetro, em relação ao parafuso de 3.5mm, foi possível confirmar experimentalmente o seu benefício biomecânico.[10] Além disso, nossos resultados sugerem que a capacidade de distribuição da tensão e a diminuição do deslocamento da fratura são fatores relevantes para o entendimento da efetividade mecânica do parafuso de Herbert. Um dos objetivos indiretos deste estudo foi analisar qualitativamente a íntima relação entre o material de síntese e a estrutura óssea utilizando a técnica de compressão interfragmentária. O contato íntimo do parafuso de Herbert, devido à ausência da necessidade de túnel liso em sua técnica (diferente do parafuso de 3,5 mm), parece ser uma hipótese para seus melhores resultados biomecânicos, além de poder ser um diferencial na estabilidade da fratura na fase de reabsorção dos bordos fraturados. Trabalhos futuros precisam melhorar a metodologia para fazer uma avaliação e uma determinação mais precisas dessa hipótese clínica ([Fig. 6]).

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Fig. 6 Análise qualitativa da relação entre o material de síntese e a estrutura óssea. (A) Relação íntima/agarrada entre o parafuso de Herbert e a estrutura óssea. (B) A necessidade de túnel liso na técnica de compressão interfragmentária com o parafuso cortical de 3,5 mm não permite o mesmo grau de relação entre a síntese e a estrutura óssea observado com o parafuso de Herbert.

Este é o primeiro trabalho a utilizar o MEF para comparar diferentes métodos de fixação, analisando variáveis biomecânicas complexas (pico de tensão equivalente de Von Mises e a distribuição de compressão e tração nas fraturas) em fraturas tipo II de Pipkin. Este estudo tem algumas limitações que devem ser ressaltadas. A falta dos efeitos de músculos e ligamentos na estabilidade da fratura, a qualidade óssea, e possíveis diferenças individuais de gênero, etnia, idade e doenças prévias não foram levadas em consideração durante as análises. Essas limitações devem ser avaliadas em manuscritos clínicos futuros.


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Conclusão

O sistema de fixação com parafuso de Herbert gerou os melhores resultados em termos de redução do deslocamento vertical, distribuição da tensão máxima principal e do pico da tensão equivalente de Von Mises, o que demonstrando sua superioridade mecânica em comparação com a do parafuso cortical de 3,5mm no tratamento das fraturas tipo II de Pipkin.


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Conflito de Interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

Suporte Financeiro

Os autores declaram que não receberam apoio financeiro de fontes públicas, comerciais, ou sem fins lucrativos para a realização deste estudo.


* Trabalho desenvolvido no Instituto de Pesquisa e Ensino, Hospital Ortopédico e Medicina Especializada (IPE-HOME), Brasília, Distrito Federal, Brasil.


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Endereço para correspondência

Anderson Freitas, MD, PhD
Instituto de Pesquisa e Ensino, Hospital Ortopédico e Medicina Especializada (IPE-HOME)
SGAS Quadra 613–Conjunto C, Brasília, DF, 70200-730
Brasil   

Publication History

Received: 16 January 2022

Accepted: 26 July 2022

Article published online:
03 October 2022

© 2022. Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. This is an open access article published by Thieme under the terms of the Creative Commons Attribution-NonDerivative-NonCommercial License, permitting copying and reproduction so long as the original work is given appropriate credit. Contents may not be used for commercial purposes, or adapted, remixed, transformed or built upon. (https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/)

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Fig. 1 Classificação de Pipkin. (A) Tipo I: fratura da cabeça femoral inferior à fóvea central. (B) Tipo II: fratura estendida superiormente à fóvea central. (C) Tipo III: qualquer fratura da cabeça do fêmur com fratura do colo do fêmur associada. (D) Tipo IV: qualquer fratura da cabeça femoral com fratura acetabular associada.[7]
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Fig. 1 The Pipkin classification. (A) Type I: fracture of the femoral head inferior to the central fovea. (B) Type II: fracture extended superiorly to the central fovea. (C) Type III: any fracture of the femoral head with associated femoral neck fracture. (D) Type IV: any fracture of the femoral head with associated acetabular fracture.[7]
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Fig. 2 Condições e contornos dos ensaios. (A) Vista frontal. (B) Vista lateral de modelo com representação de fratura da cabeça femoral tipo II de Pipkin e posicionamento durante o ensaio. Área verde na base do fêmur: ponto de fixação. Área rosa na cabeça femoral: local de carregamento. (C) Parafuso cortical de 3,5 mm. (D) Parafuso de Herbert.
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Fig. 2 Conditions and contours of the tests. (A) Frontal view. (B) Lateral view of a model representing a Pipkin type-II femoral head fracture and the position during the essay. Green area at the base of the femur: fixation point. Pink area on the femoral head: loading area. (C) 3.5-mm cortical screw. (D) Herbert screw.
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Fig. 3 Descrição do deslocamento vertical da fratura com os diferentes modelos de fixação. (A) Parafuso cortical de 3,5 mm (deslocamento: 1,5 mm). (B) Parafuso de Herbert (deslocamento: 0,5 mm).
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Fig. 4 Distribuição da tensão máxima principal nas fraturas com os diferentes modelos de fixação. (A) Parafuso cortical de 3,5 mm: 9,7 KPa. (B) Parafuso de Herbert: 1,3 KPa. Distribuição da tensão mínima principal nas fraturas com os diferentes modelos de fixação. (C) Parafuso cortical de 3,5 mm: -8,7 KPa. (D) Parafuso de Herbert: -9,3 KPa.
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Fig. 5 Distribuição do pico de tensão equivalente de Von Mises nos diferentes modelos de fixação. (A) Parafuso cortical de 3,5 mm: 7,2 GPa. (B) Parafuso de Herbert: 2,0 GPa.
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Fig. 3 Description of the vertical displacement of the fracture with the different fixation models. (A) 3.5-mm cortical screw (displacement: 1.5 mm). (B) Herbert screw (displacement: 0.5 mm).
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Fig. 4 Distribution of the maximum principal stress in fractures with the different fixation models. (A) 3.5-mm cortical screw: 9.7 KPa. (B) Herbert screw: 1.3 KPa. Distribution of the minimum principal stress in fractures with the different fixation models. (C) 3.5-mm cortical screw: -8.7 KPa. (D) Herbert screw: -9.3 KPa.
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Fig. 5 Distribution of the peak Von Mises equivalent stress in the different fixation models. (A) 3.5-mm cortical screw: 7.2GPa. (B) Herbert screw: 2.0 GPa.
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Fig. 6 Análise qualitativa da relação entre o material de síntese e a estrutura óssea. (A) Relação íntima/agarrada entre o parafuso de Herbert e a estrutura óssea. (B) A necessidade de túnel liso na técnica de compressão interfragmentária com o parafuso cortical de 3,5 mm não permite o mesmo grau de relação entre a síntese e a estrutura óssea observado com o parafuso de Herbert.
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Fig. 6 Qualitative analysis of the relationship between synthesis material and bone structure. (A) close relationship between the Herbert screw and bone structure. (B) The need for a smooth tunnel in the interfragment compression technique with the 3.5-mm cortical screw does not yield the same degree of relationship observed between synthesis and bone structure with the Herbert screw.