Palavras-chave
cotovelo - osteoartrite - fraturas do rádio
Introdução
As fraturas da cabeça radial representam mais de 50% de todas as fraturas do antebraço. Essas fraturas ocorrem com um trauma indireto através do longo eixo do rádio durante uma queda com o antebraço pronado e parcialmente flexionado.[1]
[2] Broberg e Morrey as classificam em quatro tipos (modificação da classificação Mason). As fraturas do tipo 1 são aquelas não deslocadas ou minimamente deslocadas (deslocadas em não mais de 2 mm) e o tamanho do fragmento deve incluir até 30% da cabeça (superfície articular). Se a fratura é deslocada em 2 mm ou mais, ou envolve 30% da cabeça, é considerada o tipo 2. Do tipo 3 são as fraturas cominutivas. Finalmente, fraturas do tipo 4 são as aquelas com luxação do cotovelo.[2]
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As fraturas do tipo 1 são causadas por trauma de baixa energia. Correspondem de 64 a 74% de todas as fraturas da cabeça radial.[1]
[4] Levando em conta suas características, a fratura do tipo 1 é considerada estável e não apresenta bloqueio articular mecânico. Além disso, lesões associadas clinicamente relevantes não são comuns.[5] Por tudo isso, nesse tipo de fratura, um manejo não operatório, com um curto período de imobilização, permite um bom resultado clínico sem desfechos adversos.[4] A osteoartrite da radiocapitelar (OA RC) e da articulação ulnoumeral é incomum após a fratura da cabeça radial não deslocada.[6]
Este relato de caso apresenta um paciente jovem com diagnóstico de fratura isolada e não deslocada da cabeça radial que evoluiu 8 meses depois com artrite global do cotovelo. Por meio de revisão sobre fratura da cabeça radial não deslocada, este artigo destaca a importância do acompanhamento dos pacientes para reconhecer essa possível complicação, mesmo em lesões consideradas simples.
Relato de Caso
Um homem de 35 anos, porteiro, caiu durante um jogo de futebol. Após 3 dias da lesão, o paciente compareceu ao hospital para atendimento médico. No exame físico apresentava um inchaço comum no cotovelo e sensibilidade sobre a cabeça radial. A estabilidade do cotovelo foi verificada e não havia suspeita de lesão ligamentar. Após radiografia e tomografia computadorizada, o paciente foi diagnosticado com fratura de cabeça radial não deslocada ([Fig. 1a], [b] e [Fig. 2a, b]).
Fig. 1 Radiografias iniciais do cotovelo: visões anteroposterior (a) e lateral (b).
Fig. 2 A tomografia computadorizada mostrou fratura da cabeça radial não deslocada e isolada: visões sagital (a) e coronal (b).
O tratamento inicial foi imobilização de todo o braço com gesso. Como o paciente não sentia mais dor após 7 dias de imobilização, ele parou de usar o gesso e voltou ao trabalho. Dois meses depois, o paciente realizou nova radiografia que mostrou consolidação com pouca deformidade da cabeça radial e baixo grau de osteoartrose ([Fig. 3a, b]). No entanto, apenas 6 meses depois, o paciente veio até nós com queixas de dor e limitação de movimento. Durante o exame físico, o paciente apresentou amplitude de movimento reduzida (- 80° de extensão e 110° de flexão), mas não apresentou limitação importante na rotação do antebraço. Em seguida, o paciente realizou novas radiografias do cotovelo que evidenciavam osteoartrite grave do cotovelo ([Fig. 4a, b]). Em seguida, o paciente foi submetido ao desbridamento artroscópico do cotovelo, com importante melhora na amplitude de movimento e dor.
Fig. 3 Radiografias após 2 meses da lesão demonstrando consolidação de fratura com pouca deformidade da cabeça radial e baixo grau de osteoartrose: visões anteroposterior (a) e lateral (b).
Fig. 4 Visões anteroposterior (a) e lateral (b) do cotovelo 8 meses após a lesão inicial, mostrando osteoartrite global e grave.
Discussão
Os principais resultados adversos relacionados à fratura radial da cabeça não deslocada são rigidez do cotovelo e dor ocasional no cotovelo.[4]
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[7] A artrose do cotovelo após esse tipo de fratura é rara.[6]
Herbertsson et al.[7] avaliaram os resultados a longo prazo de 27 fraturas de Mason tipo 1 e relataram que, embora os cotovelos lesionados tenham mais alterações degenerativas do que os cotovelos não lesionados, esses achados não têm significado clínico. Os casos, em sua maioria, estavam livres de dor e não apresentavam perda de movimento. Eles também relataram que os cotovelos lesionados tinham mais deformidades radiológicas do que os cotovelos não lesionados, mas essas deformidades não estão associadas à osteoartrite. Kachooei et al.[6] avaliaram se pacientes após tratamento não operatório de uma fratura isolada da cabeça do rádio tinham OA RC. Dos 54 pacientes avaliados, 1 apresentava OA RC isolado e 3 também tinham osteoartrite ulnoumeral. Concluíram, portanto, que a OA RC é incomum após essas fraturas, mesmo com algum grau de deformidade da cabeça radial.
A estabilidade do cotovelo deve ser verificada no exame físico inicial para avaliar lesões ligamentares, pois a fratura da cabeça radial pode fazer parte de uma lesão complexa do cotovelo. Kaas et al.[5] relataram lesões associadas usando ressonância magnética (RM) em 12 de 17 pacientes com fratura Mason tipo 1. No seu estudo, demonstraram que 47% dos pacientes diagnosticados com esse tipo de fratura também apresentavam lesão do ligamento colateral lateral (LCL) e 2 de 17 pacientes apresentaram lesão condral. Destes pacientes, 7 tinham uma ruptura parcial e um tinha uma ruptura completa. Embora essas lesões sejam visíveis na ressonância magnética, elas raramente são sintomáticas. Além da lesão do LCL, as lesões da membrana interóssea (MIO) também são comumente associadas com fraturas do tipo Mason 1. Hausmann et al.[8] examinaram 14 pacientes com fratura de Mason tipo 1 quanto a lesão oculta na MIO. Eles relataram que 9 dos 14 pacientes apresentavam lesões adicionais da parte distal da MIO. Como os pacientes podem ter lesões adicionais, é provável que a osteoartrite do cotovelo após a fratura do tipo Mason 1 tenha sido parte de uma lesão ligamentar mais complexa.
No nosso caso apresentado, o paciente foi diagnosticado com artrose pós-traumática grave. No entanto, no exame físico inicial, não suspeitamos de instabilidade derivada de lesão ligamentar. Portanto, como o paciente sofreu um trauma de alta energia, é provável que ele tenha tido uma lesão condral não diagnosticada pelas imagens. Outra hipótese é que o paciente tivesse uma lesão ligamentar não diagnosticada no exame físico inicial, uma vez que o exame para o diagnóstico de uma lesão sutil no ligamento do cotovelo não é fácil de reproduzir. Em ambas as hipóteses, uma RM do cotovelo provavelmente teria ajudado nesse diagnóstico e, portanto, pode ser necessária sempre que houver um trauma de alta energia.
Em conclusão, fraturas da cabeça radial do tipo Mason 1 são fraturas com baixo risco de desenvolver osteoartrite após tratamento conservador. No entanto, não há garantia de resultado favorável. Sempre que houver fortes suspeitas clínicas de lesões mais complexas, como no trauma de alta energia, uma RM pode ser solicitada, e o paciente deve ser acompanhado para que qualquer possível complicação seja identificada mais cedo.